O Teatro Amazonas amanheceu em silêncio nesta terça-feira (3/6). No palco principal, onde tantas histórias foram encenadas ao longo de mais de um século, a cena era de despedida. Colegas, familiares e artistas prestaram as últimas homenagens a Raimundo Nonato Pereira do Nascimento, o “Seu Nonato” ou simplesmente Nonatinho, que faleceu aos 90 anos.
Servidor mais antigo da casa, Nonatinho dedicou 52 anos de sua vida ao maior símbolo da cultura do Amazonas. Começou como pedreiro, em 1973, durante a reforma do teatro centenário — e nunca mais saiu. Ao longo das décadas, foi bilheteiro, porteiro, cenotécnico, assistente técnico e muito mais. Conhecia cada detalhe do prédio, dos bastidores à cúpula. Era, como diziam os colegas, um verdadeiro coringa, mas com um amor especial pelo palco, seu lugar preferido.
“Era apenas um pedreiro para fazer uma grande reforma que o Teatro Amazonas estava passando e, desde lá, ficou como funcionário. Acompanhou diversos espetáculos e recebeu diversas homenagens”, relembrou o secretário executivo de Cultura do Amazonas, Cândido Jeremias.
A cerimônia de despedida aconteceu no lugar onde ele mais se sentia em casa. O velório foi realizado no próprio Teatro Amazonas, com direito à reverência de colegas, amigos e representantes da cultura. Em cada abraço, uma lembrança. Em cada olhar, a gratidão por tudo que Nonatinho construiu — com humildade, profissionalismo e amor à arte.
“Tudo o que eu herdo dele é a humildade, simplicidade, carisma, alegria e acho que é isso que todos vão lembrar dele”, destacou o filho André Encarnação.
Mesmo com atuação nos bastidores, Nonatinho se tornou personagem central da história do teatro. Em 2019, recebeu uma homenagem especial durante a abertura do Festival Amazonas de Ópera: uma placa com seu nome foi eternizada na galeria do Teatro, ao lado de grandes artistas. Dois anos depois, sua trajetória virou artigo acadêmico publicado pela revista Luz em Cena, da Universidade do Estado de Santa Catarina, exaltando seu conhecimento técnico e sua paixão pelo ofício.
“Ele e o Teatro são a mesma coisa. Aqui era a casa dele, onde ele passava mais tempo e o amor dele por esse teatro é infinito e a gente tem Nonato olhando por cada lugar desse teatro”, disse o gerente de espetáculo do Teatro Amazonas, Sandro Paulo.
A história de Seu Nonato também é a história de um tempo. Filho de um ajudante de pedreiro e de uma lavadeira, nasceu em 1935 e ajudou a restaurar com as próprias mãos o piso de mármore do hall de entrada — ainda firme, como seu legado. Aos poucos, se tornou guardião da cultura amazonense, respeitado por todas as gerações que passaram pela casa.
O presidente do Sistema Encontro das Águas, Oswaldo Lopes, também prestou homenagem. Ele destacou a relevância do servidor para a preservação da memória cultural do Estado. “O Amazonas perde um guardador do Teatro Amazonas, um cara que sempre cuidou como se fosse a casa dele. Aos familiares e amigos minhas sinceras condolências”, lamentou o diretor presidente do Sistema Encontro das Águas, Oswaldo Lopes.
O sepultamento de Raimundo Nonato está marcado para as 10h de quarta-feira (4/6), no Cemitério Recanto da Paz, no município de Iranduba. Em nota de pesar, o Governo do Amazonas reconheceu o papel fundamental de Nonatinho para a cultura do Estado, ressaltando que sua trajetória permanecerá viva na história e na memória de todos que vivem e fazem arte no Amazonas.
*Com informações do repórter João Paulo Oliveira e Agência Amazonas



